domingo, 12 de maio de 2013

Ordenação de 1520 - O Olho do Dono

Paulo Werneck

Finalmente, um recado diretamente enviado aos prepostos do Rei: que ajam com correção, lisura e empenho na administração dos negócios reais. O monarca exige empenho e dedicação. Diz-se que é o olho do dono que engorda o gado, mas no comércio das Índias o olho do dono está longe, em Lisboa ou Évora, a meses de distância em arriscadas viagens marítimas, sem telefone nem internet. Mas o olho ausente procura ser substituído pela ameaça do porrete real...

Finalmente, o de sempre: as burocracias textuais de aprovação das normas legais.
Ordenações da India do Senhor Rei D. Manoel
... continuação ...
[28] Ordenamos, e mandamos pera a todos ser notorio, posto que até aqui por dereito, e razam cada hum assi ho deuesse fazer, e saber, que todos nossos feitores, neguociadores, administradores, que em quaesquer nossos trautos, neguociações, administrações, por qualquer modo que sejam, em nossa fazenda qualquer carreguo de neguociar, ou administar em quaesquer partes, assi de nossos reynos, e senhorios, como fóra delles teuerem, quer lhe sejam por nós dados, ou por quaesquer nossos officiaes, que pera ello nosso poder tenham, quer se elles nisso metam a neguociar por qualquer modo que seja, ponham no dito trauto, feitoria, neguoceo, ou qualquer administração, em que assi per nos feitorizarem, neguociarem, ou administrarem, toda diligencia, e cuidado possível, e tal, que toda pessoa de bom cuidado, e diligencia poeria, em modo que por sua culpa grande, nem pequena; ou por sua negligencia, e descuido, ou por nom poer toda diligencia, a dita neguoceacam, ou administraçam, que assi administrar, nem nós nom recebamos perda, nem dano, nem leixemos de guanhar ho que se guanhar podéra, se por elle tal negligencia nom passara, ou a tal negligencia posera. E nom ho comprindo assi nos paguará toda perda, e dano, que assi na dita neguociaçam, e administraçã que elle administrar, como em qualquer outra nossa feitoria, ou administraçã, ou fazenda qualquer outra nossa, por qualquer via que seja por bem dello se causar; e aalem dello lhe daremos ho castiguo, e pena que merecer, segundo a qualidade do caso requerer, ho que todo auerá luguar, nom somente nos feitores, negoceadores, administradores sobreditos de nossa fazenda, mas em quaesquer officiaes e pessoas, de qualquer officio, e carrego que sejam, mayor, ou menor que hos sobreditos, e por qualquer modo auerem qualquer carreguo, ou administraçam de nossa fazenda. E por esta ordenação nom tolhemos auerem as mays, e quaesquer penas que por dereito, e nossas ordenações merecerem, hos que em cada hũa das sobreditas cousas encorrerem.

[29] E porém mandamos ao nosso regedor, e governador das casas da sopricação, e do ciuel, e aos desembarguadores dellas, e ao juiz dos nossos feitos, e indias, e de guinee, e a todolos nossos corregedores, juyzes, e justiças, que cumprã, e façã muy inteiramente cumprir, e guardar estas nossas ordenações, assi como nellas he contheudo. E ao nosso chanceller moor, que as mande pubricar em a nossa chancellaria, pera de hi em diante se usar dellas em todos nossos reynos, e senhorios: dadas em a nossa cidade de Evora aos 8 dias de Setembro de 1520 annos.

[30] As quaes ordenações notificamos, que foram já pubricadas em nossa chancellaria.
Fontes:
CAMINHA, Antonio Lourenço. Ordenações da India do Senhor Rei D. Manoel. Lisboa: Impressão Régia, 1807.

Veja também:
Início: "Ordenação de 1520 - O Retorno do Investimento"
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